segunda-feira, 28 de outubro de 2013

O JULGAMENTO DE UM ATEU APÓS A MORTE


O Júri (1861), por John Morgan, retrato do leitor deste texto.

     Em certo dia, certa hora, certo minuto, o Sr. David Justo, autor desse blog, morrerá! Ateu convicto, ao chegar ao céu, percebendo que estava plenamente enganado quanto a existência divina, fala baixinho, introspectivamente:
      - AGORA FUDEU!
     Neste momento, um anjo gentilmente o pega pelo mão e conduz a uma belíssima e confortável sala de julgamento. Sentado a esquerda está o ansioso Lúcifer, em pessoa! Considerando que o Sr. David passou uma boa parte da vida desdenhando dos poderes do capeta, o reduzindo a no máximo um funcionário público, é natural que o diabo não perderia a oportunidade de se vingar!
     - PUTA QUE PARIU! AGORA FUDEU DE VEZ! - Pensou David, ao ver o tinhoso.
     A direita, uma cadeira vazia. Aparentemente ali sentaria seu advogado de defesa. Mas isso David não estranhou. Quem defenderia um ateu?
     O juiz sentava em uma cadeira tão alta que era inalcançável a olho nu. Mas era plenamente possível perceber que havia alguém ali. Mas David não acreditava em Deus, então pensou ser qualquer ente, menos o próprio Jeová.
     Pois bem, o diabo tomou a palavra:
     - Caríssimos presentes, bom dia! E que bom dia! É com grande gozo que este humilde funcionário público vem aos presentes falar a respeito da conduta do réu, Sr. David Justo! Este homem, que, como todos sabem, nunca acreditou na nossa existência! Logo, refuta que existam pecados, e agia livremente, sob o pretexto de "praticar a virtude pela virtude e o pecado deixa pra quem acredita nele." Essas palavras proferidas pela boca do acusado e sua conduta cética, a meu ver, são razão suficiente para que o mesmo não mereça o acesso ao paraíso. Como pode alguém usufruir de algo que nunca acreditou?? É justo para com os crentes, o fieis a Deus?? Creio que não! Desta forma, esse eu vou levar. O inferno é certamente o lugar mais apropriado ao Sr. David Justo.
     A essa altura, David olha para o júri (leitor) e observa que uma boa parte concorda com o acusador. Seus argumentos são válidos. Seria injusto o paraíso a um ateu. E onde estará o advogado? Lúcifer toma novamente a palavra:
     - Caríssimos, como podem ver, o réu é tão culpado, que nem apareceu um advogado para defendê-lo! Que tal se adiantássemos as coisas e o juiz proferisse logo a sentença condenatória?
     - Diabo safado! - retrucou David. Se passei uma vida inteira lhe desqualificando, não vai ser agora que vou lhe repeitar! Não vou me entregar fácil! Uma parte da minha vida, fui católico. Logo, rezei incontáveis ave-marias. "Roga por nós, pecadores! Agora e na hora da nossa morte" é o que diz a oração. E eu assisti o Auto da Compadecida, sei bem como as coisas funcionam aqui. Minha advogada vai comparecer em tempo. Até porque eu sempre defendi a importância dela pro cristianismo, embora fosse ateu. Diferente de ti, seu corno safado, que só serve pra que alguns de nós humanos o usemos como desculpa esfarrapada por seus pecados! 
      Antes que o diabo tivesse tempo de reagir ao insulto, Maria apareceu. Vestida tal qual uma executiva, terninho, óculos e cabelo amarrado, muito serena e tranquila. Fantástica! Ligou seu iPad e pediu pra aguardar um pouco, pra que pudesse olhar brevemente o caso. Até que falou em particular com David.
     - Sr. David. Muito me preocupa o seu ceticismo. Vejo que mesmo diante de nós aqui nesse momento, o fato de não conseguir enxergar o juiz é razão suficiente pra o Sr. continuar não acreditando em Deus. Mas vou defendê-lo. 
     Maria vira-se para o júri (a essa altura uns com sono, outros pensando no capítulo de ontem da novela) e diz:
     - O réu aqui presente cometeu inúmeros pecados, entretanto nenhum grave o suficiente para condená-lo caso fosse crente. Teve uma vida moderada, familiar, estudou, trabalhou e cumpriu com suas obrigações quanto as leis dos homens. Defendia, inclusive, muitos princípios cristãos, embora não acreditasse que tais princípios fossem de inspiração divina. Alego em sua defesa seu modo de vida, plenamente puro e inocente, pois em suas convicções anti-teístas, ele só visava o bem. Meu próprio filho disse "deixai vir a mim as crianças, porque delas é o reino dos céus", reabilitando os inocentes e puros de coração (crianças). Penso que sim, o lugar desta criança a qual me refiro é o paraíso, que deve ser absolvido pelo seu pecado principal: o Ateísmo. Tenho convicção que na eternidade, não haverá mais argumentos para ele continuar afirmando que nosso Pai não existe! E não é isso que buscamos, enquanto poder judiciário? A utopia da reabilitação, da reintegração social do réu? Sem mais.
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     Sim, o texto acabou aqui. Preferi não concluí-lo. Mas observem que todas as vezes que citei o júri, remeti ao leitor. Esse é o objetivo. O leitor é o júri. pergunto a vocês:

DEVE O SR. DAVID JUSTO SER CONDENADO À ETERNIDADE NO INFERNO, UNICAMENTE PORQUE É ATEU, EMBORA TENHA UMA VIDA MODERADA? 

DEVE UM RELIGIOSO SER ABSOLVIDO NO JULGAMENTO FINAL, EMBORA TENHA UMA VIDA DESREGRADA E PECAMINOSA AO EXTREMO, UNICAMENTE PELO FATO DE ACREDITAR EM DEUS E TATUAR NA PELE A FRASE "SÓ DEUS PODE ME JULGAR"? 



David Justo.

Obs.1: Quem tem acompanhado meu blog sabe que eu publico todas terças e sextas. Vou mudar um pouco o perfil das postagens a partir da semana que vem. Toda terça, publicarei textos com o perfil atual. As sextas, vou comentar alguma notícia relevante. Tenho perdido ótimos assuntos pra discorrer, a ideia é não perdê-los mais.

Obs.2: Maria. É o assunto do próximo texto, terça que vem.          


6 comentários:

  1. O Sr. David Justo não poderia ser condenado a nada eterno, pois não existe castigo eterno, ou Julgamento Final.
    Ele iria reencarnar novamente, e através disso procurar pela Verdade novamente.
    Depois que morre, quem acredita em nada, vai encontrar o nada.

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  2. Voto pela absolvição do senhor David.
    ''Se alguém precisa de religião para ser bom, a pessoa não é boa, é um cão adestrado.''
    Dito isto, não importa o ateísmo mas sim o que a pessoa é por si.

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  3. Caro David, você está surpreendendo com seus textos. Bem escritos, coerentes e levando o leitor a pensar. Não estou querendo dizer que você é o suprassumo nessa arte, mas já um começo.
    Sou cristão católico e acredito sim em Deus, mas tenho lá minhas dúvidas sobre algumas "verdades" reveladas pela Igreja. Mas isso é assunto para outro momento.
    Sobre o seu julgamento, vou utilizar um dos recursos do judiciário e solicitar mais tempo para estudar o processo, pois ainda preciso de mais subsídios filosóficos e teológicos para fundamentar meu parecer. Já tirei da gaveta Platão e Sêneca pra começar.
    Pergunto se você já leu o livro: A Cabana. Lá tem um capítulo que fala de um julgamento. Gostaria de saber sua opinião se você fosse o réu ou o juiz naquele caso.
    Já que você gosta de falar de religião e religiosidade, voltarei com algumas questões para colocar em debate, mas não agora, pois preciso tomar meu café....
    Ass: O Chefe

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  4. Muito boa sua colocação sr David Justo, mais um reflexo que você não é um ateu convicto.Sobre o julgamento, todos nós seremos julgados, mais a santa escrituras fala sobre um advogado justo e fiel que é cristo Jesus, ele será nosso advogado perante as acusações do tinhoso, e somente Deus pode julgar vivos e mortos.Tenho certeza que um dia você vai ter um encontro da suas dúvidas e descrença, o papai do céu ama você meu amigo, lembro da história de Saulo ele não acreditava no senhor Jesus, até o dia que o senhor se revelou a ele!!

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    1. - Amigo Alex, não vejo onde você enxergou qualquer falta de convicção ateia em mim, nem neste texto, nem neste blog, nem em algum dos nosso inúmeros debates a respeito deste assunto. Me pareceu mais uma daquelas técnicas pega-trouxa largamente utilizadas por pilantras pseudo-religiosos, plantar dúvida pra ver tornar a vítima susceptível. Mas não sou cabeça vazia, comigo não funciona.
      - Quanto a Jesus ser o advogado, se você prefere assim, apenas troque no texto. Toda vez que citei Maria, leia Jesus. Não mudará o sentido do texto, e talvez você o compreenda melhor, e quem sabe, não responda a pergunta que propus no fim do texto.
      - "Tenho certeza que um dia você..." - Mude a palavra certeza por fé nessa sentença. Se você trocar, será pra mim o único argumento válido no seu comentário.

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